AMICUS CURIAE

Conceito, características e requisitos.

Marta Fadel Lobão

Notemos primeiramente que o significado literal de amicus curiae, do latim, significa amigo da corte. Ou seja, desde a origem etimológica do termo, há uma descrição ou ideia do significado do instituto jurídico. Seria, em tese, um terceiro que acaba por intervir no processo judicial que não faz parte[1], tendo alguns autores que consideram como modalidade de intervenção de terceiros.

No ordenamento jurídico brasileiro essa possibilidade está prevista no artigo 138, do Código De Processo Civil, podendo ser pessoa natural ou jurídica, exigindo-se, todavia, haver uma representatividade adequada, ou seja, com alguém capaz de representar o interesse que busca no referido processo[2].

Nesse caso, umas das importantes características desse instituto é que o amicus curiae não é um terceiro imparcial como o Ministério Público quando atua como fiscal da lei, mas irá defender um objeto, uma pretensão, nos autos do processo que intervir.

O interesse, portanto, que legitima a intervenção e participação do amicus curiae é aquele institucional, base do interveniente. Em outras palavras, significa que a Ordem dos Advogados do Brasil poderia intervir naqueles processos que dizem respeito à advocacia, as igrejas naqueles processos que dizem respeito a liberdade religiosa ou outros assuntos inerentes.

Perceba-se, contudo, que a intervenção não pode ocorrer em qualquer processo, é imprescindível que haja relevância da matéria discutida sobre o tema objeto da demanda, ou a repercussão social da controvérsia, requisitos ora objetivos. Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de permitir a intervenção somente em casos objetivos, sem subjetividade discutida, sendo somente admitida nesta de forma excepcional.

Nesse sentido, vale citar o julgamento do AgRg na PET no REsp 1336026/PE, de relatoria do Excelentíssimo Ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, Primeira Seção, DJe 28/03/2017, que asseverou a necessidade da excepcionalidade da admissão de intervenção no processo que trata sobre questão subjetiva. Senão vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. INFLUÊNCIA DA DEMORA OU DIFICULDADE NO FORNECIMENTO DE FICHAS FINANCEIRAS NO CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. ESTADOS DA FEDERAÇÃO E DISTRITO FEDERAL. PLEITO DE INGRESSO COMO AMICUS CURIÆ. INDEFERIMENTO. DEFESA DE INTERESSE DE UMA DAS PARTES. APORTE DE DADOS TÉCNICOS. DESNECESSIDADE.

1. O amicus curiæ é previsto para as ações de natureza objetiva, sendo excepcional a admissão no processo subjetivo quando a multiplicidade de demandas similares indicar a generalização do julgado a ser proferido.

2. O Supremo Tribunal Federal ressaltou ser imprescindível a demonstração, pela entidade pretendente a colaborar com a Corte, de que não está a defender interesse privado, mas, isto sim, relevante interesse público (STF, AgRg na SS 3.273-9/RJ, Rel. Ministra Ellen Gracie, DJ 20/6/2008).

3. No mesmo sentido: “O STF já apreciou a questão da natureza jurídica do amicus curiæ, afirmando, em voto do Relator, Min. Celso de Mello, na ADIn n. 748 AgR/RS, em 18 de novembro de 1994, que não se trata de uma intervenção de terceiros, e sim de um fato de ‘admissão informal de um colaborador da corte’. Colaborador da corte e não das partes, e, se a intervenção de terceiros no processo, em todas as suas hipóteses, é de manifesta vontade de alguém que não faz parte originalmente do feito para que ele seja julgado a favor de um ou de outro, o amicus curiæ, por seu turno, somente procura uma decisão justa para o caso, remetendo informações relevantes ao julgador” (STF, ADPF 134 MC, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 22/4/2008, publicado em DJe 29/4/2008).

4. Na espécie, o interesse dos Estados da Federação e do Distrito Federal vincula-se diretamente ao resultado do julgamento favorável a uma das partes – no caso, a Fazenda Pública -, circunstância que afasta a aplicação do instituto.

5. Ademais, a participação de “amigo da Corte” visa ao aporte de informações relevantes ou dados técnicos (STF, ADI ED 2.591/DF, Rel. Ministro Eros Grau, DJ 13/4/2007), situação que não se configura no caso dos autos, porquanto o tema repetitivo é de natureza eminentemente processual.

6. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg na PET no REsp n. 1.336.026/PE, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 22/3/2017, DJe de 28/3/2017.)[3]

Em suma, a admissão do amicus curiae no ordenamento jurídico brasileiro é restrito a questões objetivas e de interesse amplo, não permitindo que pretensões individuais subjetivas sejam objeto, por exceção daquelas que tenham uma multiplicidade de processos e generalidade do assunto jurídico.

Na argentina, por sua vez, vale analisar o artigo 7º, da Ley nº 24.488, que assim dispõe:

En el caso de una demanda contra un Estado extranjero, el Ministerio de Relaciones Exteriores, Comercio Internacional y Culto podrá expressar su opinión sobre algún aspecto de hecho o de derecho ante el tribunal interviniente, en su carácter “amigo del tribunal

Há, ainda, previsão de que qualquer pessoa pode representar em processo na qualidade de assistente oficioso, mas limitando a atuação a expressão de opinião fundamentada sobre o tema em debate nos autos.

Nesse caso, a jurisprudência argentina[4] prevê alguns critérios ou requisitos para permissão do amicus curiae como interveniente. São eles: ser pessoa física ou jurídica que não sendo parte no processo, tenha competência sobre a questão em debate; a intervenção somente seria possível em questões que transcendam o interesse das partes a alcançar interesses coletivos; a intervenção se limita a expressão de opinião fundamentada, não vinculante ao magistrado julgador; deve ser fundamentada em interesse de participação na causa e informar relacionamento com as partes; é discricionário do órgão julgados decidir a intervenção; e os prazos de intervenção devem ser estritamente observados.

De toda forma, nota-se que os requisitos e critérios de ambos os países são semelhantes, sendo uma forma – discutível – de intervenção de terceiros apta a auxiliar com opiniões fundamentadas os órgãos julgadores com um interesse parcial, podendos ser de qualquer das partes ou até alheia a elas.

Referências bibliográficas

Acordada Nº 28/2004 del 14 de julio del 2004. Pronúncias outras existem em que se reiteram estes critério, Acordada Extraordinaria Nº 85 del 19 de julio del 2007.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg na PET no REsp n. 1.336.026/PE, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 22/3/2017, DJe de 28/3/2017. Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp. Acesso em 22.02.2024.

BUENO, Cassio S. Amicus Curiae no Processo Civil Brasileiro – Um terceiro enigmático, 3ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

CÂMARA, Alexandre F. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Grupo GEN, 2022.


[1] BUENO, Cassio S. Amicus Curiae no Processo Civil Brasileiro – Um terceiro enigmático, 3ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

[2] CÂMARA, Alexandre F. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Grupo GEN, 2022.

[3] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg na PET no REsp n. 1.336.026/PE, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 22/3/2017, DJe de 28/3/2017. Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp. Acesso em 22.02.2024.

[4] Acordada Nº 28/2004 del 14 de julio del 2004.

Pronúncias outras existem em que se reiteram estes critério, Acordada Extraordinaria Nº 85 del 19 de julio del 2007.

por Marta Fadel e Hecilda Fadel

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Marta Fadel é colecionadora de arte e advogada atuante nas áreas de direito empresarial e tributária com especialização em Processo Civil, Civil e Empresarial.

É membro conselho da OAB/RJ, exerce os cargo de diretora Curadora do Instituto Cultural Sérgio Fadel, membro do Conselho deliberativo do MASP, Membro conselho do MAM/RJ, Amigos da Pinacoteca e conselheira do Prêmio Pipa de artes plásticas no ano de sua fundação.

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